Em dezembro de 2019, o McDonald’s Saint-Barthélemy, em Marselha, França – fechado desde 2018 – teve sua liquidação judicial decretada. Com a pandemia, todas as instituições de caridade e ajuda social foram fechadas, deixando as pessoas desamparadas, independentemente de sua situação legal. O McDonald’s foi, então, transformado em um banco de alimentos e passou a nutrir mais de 2.000 famílias por semana. O objetivo dos ex-funcionários, liderados por Kamel Guemari e Fati Bouarua, foi alcançado: convertê-lo em um restaurante social servindo refeições baseadas na renda dos clientes, pois quando o primeiro lockdown começou, as pessoas na região estavam mais preocupadas com a fome do que com a Covid. Atualmente, o projeto evoluiu para dar espaço a uma Sociedade Cooperativa de Interesse Coletivo, criando empregos e apoiando os mais necessitados.
“Não há nada mais perigoso que o capitalismo – é insaciável”, diz Bouarua, um ativista apaixonado de origem argelina que cresceu em Marselha. Ele descreve com entusiasmo a visão de transformar o espaço em um novo restaurante socialista radical para servir a comunidade empobrecida. O projeto é um símbolo de resistência e esperança em um dos bairros mais negligenciados da cidade, buscando criar um modelo sustentável e inclusivo de alimentação.
Tendo passado a vida trabalhando em causas sociais e organizando voluntários, Bouarua vê o simbolismo poderoso de requisitar um drive-in de fast food multinacional para alimentar milhares de famílias semanalmente. Além de aliviar o desemprego, é um lugar digno para comer fora. Com a ajuda de uma campanha poderosa nas redes sociais, Bouarua, seu colega Guemari e os outros funcionários arrecadaram fundos para transformar o McDonald’s fechado em um banco de alimentos.
A filial de McDonald’s em questão foi a primeira construída nos subúrbios pobres ao redor das grandes cidades francesas, entre os bairros predominantemente muçulmanos de Saint-Marthe e Saint-Barthélémy. Aberto em 1992 com apoio governamental, o restaurante oferecera emprego a 77 moradores locais com contratos longos e protegidos.
O letreiro foi modificado para “L’Après M”, e o espaço se tornou um centro de ajuda comunitária, com agricultores doando produtos e lojas oferecendo alimentos. Nas primeiras cinco semanas mais de 100.000 pessoas receberam cestas de alimentos. “Estamos a caminho de 50.000 pessoas doando €25 cada”, diz Bouarua.
O Village des Initiatives d’Entraide (V.I.E) é uma extensão do projeto, com bangalôs e contêineres no estacionamento funcionando como uma plataforma logística para distribuição de alimentos. O V.I.E realiza várias ações solidárias, como o U.B.E.R Solidaire e a criação de um jardim urbano.
O projeto também inclui uma cozinha coletiva para apoiar os cozinheiros voluntários e uma plataforma de transformação de resíduos, equipada com biodigestores e uma conserva popular, que conscientiza sobre a proteção ambiental e o combate ao desperdício. Um polo administrativo promoverá o compartilhamento de conhecimento, acesso a direitos e educação popular, além de fomentar a inserção e formação profissional. O exemplo do L’Après M é potente e inspirador: um dos símbolos máximos do capitalismo (uma filial do McDonald’s) dando lugar a uma grande iniciativa socialista.