Todas as 11 empresas de água e esgoto na Inglaterra e no País de Gales estão sendo investigadas pela Water Services Regulation Authority (Ofwat), a Autoridade de Regulação de Serviços de Água, que como órgão responsável pela normatização econômica da rede privatizada avalia a prática de lançar imundícies no mar.

A investigação foi aberta em 2021 e, embora atinja um terço das oficinas de tratamento, o fato é que a prática criminosa e altamente poluente mais do que dobrou, com as multas sendo incorporadas como “custo do negócio” da rede, totalmente privatizada, denunciam os ativistas.

O cálculo é simples, protestam os analistas, uma vez que as multas ao longo dos 35 anos do seu afastamento do controle público somam R$ 2,14 bilhões contra um superlucro extraordinário, escancarado nos R$ 520 bilhões distribuídos em dividendos aos acionistas, conforme apurou um estudo da Universidade de Greenwich. Sem falar nos salários astronômicos pagos aos seus executivos. Na prática, observaram, as multas acabam sendo simplesmente absorvidas como uma despesa comercial regular.

“Filhas da privatização promovida em 1989 pelo governo liberal de Margareth Thatcher, as empresas privadas receberam os serviços e seus ativos livres de débitos e agora estão atoladas em dívidas”, apontou o Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (Ondas). Além disso, assinalou, “estão operando com índices de perdas elevados e crescentes e vêm poluindo sistematicamente praias e rios com esgotos extravasados de sistemas de coleta e tratamento que não foram modernizados”.

EMPRESAS PRIVATIZADAS LANÇAM DELIBERADAMENTE ESGOTO NO MAR

A Southern Water já estava na lista de monitoramento e foi multada em 90 milhões de libras (R$ 643 milhões) por despejar deliberadamente esgoto no mar. Outros casos foram abertos contra a Thames Water – a maior das empresas privatizadas, que atende 16 milhões de usuários residentes em Londres e arredores (cerca de 25% da Inglaterra) – a Anglian Water, Northumbrian Water, South West Water, Thames Water, Wessex Water e Yorkshire Water em 2022, mas as investigações ainda estão em andamento.

O fato é que desde então os vazamentos mais que dobraram, saltando de 1,75 milhão de horas em 2022 para 3,6 milhões de horas em 2023. Diante das denúncias e das evidências, a Ofwat anunciou que Dwr Cymru Welsh Water, Hafren Dyfrdwy, Severn Trent e United Utilities também estarão sendo supervisionadas.

Para James Wallace, CEO da River Action (Ação do Rio), organização que trabalha para a recuperação das águas da Inglaterra, “as penalidades devem incentivar os poluidores condenados a atualizarem sua infraestrutura de vazamento, em vez de absorver as multas como um custo do negócio”. “Sempre que uma empresa de água é considerada culpada de danos ambientais aos nossos rios, precisamos da punição proporcional ao crime”, defendeu.

De acordo com Cat Hobbs, diretora da We Own It (Isso é Nosso!), associação que luta pela propriedade pública, “não podemos nos dar ao luxo de continuar deixando empresas privadas acumularem dívidas e vazarem dividendos às nossas custas, precisamos desse dinheiro para limpar rios e mares”.

“O SISTEMA ESTÁ QUEBRADO”

Instituição que luta pela limpeza do oceano, a Surfers Against Sewage (Surfistas contra o esgoto), acredita que o momento é de barrar o retrocesso. “Está claro para todos que o sistema está quebrado. Estamos pedindo uma investigação pública completa, precisamos de mudanças radicais para acabar com a crise do esgoto de uma vez por todas”, ressaltou Henry Swithinbank, dirigente da entidade.

Em pronunciamento no Parlamento, a avaliação da líder do Partido Verde, Caroline Lucas, reiterou a necessidade de mudanças. “As empresas de água não tinham dívidas quando privatizadas. Desde então, pegaram 52 bilhões de libras (R$ 371,5 bilhões) emprestado e pagaram centenas de bilhões em dividendos. Enquanto isso, temos o escândalo da poluição por esgoto. A privatização da água foi um erro grave e precisa ser corrigido permanentemente”, concluiu.