O projeto ultraliberal encabeçado pelo presidente Javier Milei na Argentina tem alterado fortemente os hábitos alimentares dos cidadãos, e parte desta realidade foi revelada pelo relatório da Bolsa de Comércio de Rosário, publicado nesta segunda-feira (08/07), no qual se observa que o país chegou ao menor consumo médio de carne bovina nos últimos 110 anos.

O informe registrou que, nos primeiros quatro meses de 2024, os argentinos tiveram um consumo médio de carne bovina de 42 quilos por pessoa. O recorde negativo anterior foi registrado em 1922, quando se chegou a 44,5 quilos por pessoa.

Durante a pandemia, no governo de Alberto Fernández (2019-2023), também houve uma queda nos índices, que chegou até 50 quilos por pessoa em seus piores momentos. Porém, no último ano do governo peronista (centro-esquerda), houve um pequeno crescimento, até 56 quilos por pessoa.

Considerando os números do governo anterior, portanto, esse primeiro quadrimestre da gestão de Milei registrou uma queda de dois dígitos no consumo per cápita de carne bovina.

O índice da Bolsa de Comércio de Rosário foi criado justamente em 1914. Portanto, este é o menor nível de consumo de carne na Argentina desde que existe essa medição.

Além da carne bovina, o leite também registrou uma diminuição acentuada em seu consumo por parte dos argentinos, chegando a 169 litros por pessoa – novamente, com números bem abaixo dos apresentados durante o governo de Fernández, que mostrou um crescimento do comércio desse item, de 182 para 194 litros per cápita durante os quatro anos de gestão.

O relatório da Bolsa de Comércio de Rosário estima que, se essa tendência se mantiver até o final do ano, os argentinos deverão consumir 9% a menos de proteína animal durante 2024, em comparação com o ano anterior, podendo atingir a taxa mais baixa já registrada neste século.

Prioridade para as exportações

Os números se tornam ainda mais impactantes ao se considerar que a Argentina é um dos maiores produtores mundiais tanto dos dois itens: a carne bovina e o leite.

No caso da carne, o país sul-americano é o quinto maior produtor mundial – atrás de Estados Unidos, Brasil, China e União Europeia, nessa ordem – e fornece 3,0 milhões de toneladas por ano, equivalentes a 5,1% da produção global, de acordo com dados de 2023 do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, por sua sigla em inglês).

A Argentina também está em nono lugar entre os maiores produtores mundiais de leite e produtos lácteos, com cerca 9,8 milhões de toneladas por ano – desta vez, de acordo com o informe da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentos (FAO), do ano de 2022.

Uma das razões pela qual o consumo interno tem diminuído, segundo analistas do diário argentino El Destape, está no fato de que as políticas do governo de Javier Milei têm assegurado uma alta prioridade para as exportações desses produtos, atendendo às reivindicações dos grandes empresários do agronegócio local, o que gera efeitos colateriais como a escassez e a disparada de preços no mercado interno.